"E tu, bondosa alma, que te sentes tão angustiada como ela...
Consola-te com os seus sofrimentos, e permite que esta pequena personagem se torne sua amiga
(com todo vosso zelo e compaixão) que, por destino ou culpa própria, não tiveres outro mais próximo.
Não poderei recusar vossa admiração e amor para essa alma, nem ao seu caráter.
E com lágrimas, acompanhe o seu destino."

Sofrimentos do Jovem Werther (Primeiro Livro) - Goethe

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

76_ Crônicas além do mar VII


Chegando à conclusão 

— Camilla, vamos ver se o barco ainda está lá.
 — Certo. 
   Encontraram Yuki no saguão, patrulhando o hotel:
 — Garotas, alguma de vocês viu a Solange em algum canto?
 — Não.
 — Nem eu.
   Na mesma hora, outra mulher entrou no recinto. Era a empregada de Solomon. Ela não sabia o que havia acontecido com a irmã do chefe, nem o que elas consideravam.
 — Na noite passada, Solange parecia estar com pressa e saiu do resort.
   A noticia dela assustou as duas mais velhas. Yuki também não compreendeu as circunstâncias.
 — Harumi, será que ela pegou o barco e saiu da ilha?
 — Com licença empregada, foi essa a última vez que você viu ela?
 — Não posso ter certeza.
 — A que horas?
 — Acho que foi a uma da manhã.
   E foi isso mesmo que elas constataram quando foram ao píer. A lancha não estava mais lá. Resolveram voltar ao quarto e colocar as idéias no lugar.
 — Harumi, você acha que a Solange realmente matou o senhor Sol?
 — Como assim?
 — Eu estive pensando. Baseando-se no testemunho da empregada, ela saiu da ilha tarde da noite, não foi? Mas quando eu toquei o corpo dele naquela hora, ele ainda estava quente. Resumindo, quando nós o vimos, Solomon não tinha morrido há muito tempo.
 — O que você quer dizer com isso? Solange saiu do resort na noite do tufão e andou um pouco pela ilha antes de esfaquear o Solomon e fugir?
 — Não acho. Mesmo presumindo que Solomon foi morto uma hora antes de o encontrarmos, nós já estávamos acordados e andando pelo hotel, não é?
 — Sim, mas e daí?
 — Seria anormal não ouvirmos um som ou um grito?
 — Mas é estranho. Você está querendo dizer que ele ficou vivo por algumas horas depois de ter sido esfaqueado no peito e se trancou no quarto? Então se a Solange não era a assassina, qual motivo ela teria para fugir...
 — Espera! Eu sei a verdade por trás deste caso. Não há dúvidas de que Solange esfaqueou seu irmão, senão, como você disse, ele não teria motivos para fugir.
 — Bem, isso mesmo.
 — Não sei quais seriam os motivos, mas ele o fez. Devido que tenha sido um assassinato premeditado. Provavelmente eles discutiram, ele pegou a faca de cortar frutas que estava por perto e a usou para matá-lo. Mas a faca não atingiu o coração dele, pois a agenda obstruiu o caminho da faca, que acabou não causando um ferimento fatal. Mas é aí que as coisas se tornam complicadas. Solomon pode ter desmaiado pelo choque. Depois de ver isso, Solange pode ter acreditado que o matou. O problema é o que vem depois. Solomon, que acabou de desmaiar, continuou consciente até esta manhã. Quando despertou, ele ficou de pé, tonto, e lembrou-se que sua irmã tentou mata-lo. Sem pensar claramente, ele trancou a porta e depois deve ter tropeçado e caído com o rosto no chão. Com isso a faca foi enterrada no peito dele, e Sol conheceu seu fim.
   Micaela havia acordado no meio da explicação. Juntou os fatos e percebeu algo que não batia:
 — Espera, como tudo isso poderia acontecer tão perfeitamente?
 — Você tem outra explicação, Mica?
 — Solange deveria ser capaz de notar se ela realmente matou o próprio irmão ou não. Além disso, o corpo dele estava de rosto para cima. Se sua dedução estivesse correta, Sol seria encontrado com o rosto para baixo, concorda Cacá?
 — Sim, mas... Mas espere. Então...
   Algumas idéias brotaram, e tudo começou a rodar. Fitou Micaela diretamente nos olhos, mas não conseguiu pronunciar mais nada. Sentia a confusão que causou na mente das amigas, mas a compaixão tomou conta segundos depois.
 — Camilla, o que houve?
 — Bem, não foi nada... Acho que eu estava errada. Vou lá fora tomar um ar.

terça-feira, 25 de outubro de 2011

75_ Crônicas além do mar VI


   Incompreensão

   Camilla foi a primeira a conseguir se mover. Caminhou até o corpo para medir a pulsação, mas o mordomo impediu o toque.
 — Não mexa no corpo — e com os dedos no pescoço dele, concluiu — ele está morto...
   Suas reações foram as mais diversas possíveis: Alex continuou imóvel; Camilla levou a mão à boca; Micaela desmaiou nos braços da Harumi.
 — Parece ser uma faca para cortar frutas, concluiu.
    Pairava um ar claustrofóbico, catastrófico naquele cômodo: a fenestra sacudia violentamente, mas não havia perigo de abrir por causa da trinca.
 — Camilla, dá uma olhada!
   Harumi apontou para a faca. Ela atravessou a agenda que o senhor guardou no bolso da camisa, o que apontava que era preciso muita força para fazer isso. Deduziram o seguinte: era seguro afirmar que o assassino era mais velho que os garotos. O fato de que Solange não foi vista em nenhum lugar significa que... Melhor não deixar mais ninguém saber disso.
    “É o melhor que temos a fazer” dizia Harumi com um piscar. Com o passar do tempo, as duas amigas aprenderam a conversar apenas com um único olhar.
 — Esta situação é, para todos os propósitos, um círculo fechado. E à primeira vista também parece ser um homicídio.
   O mordomo caminhou até a janela e continuou sua fala:
 — Além disso, ocorreu em um quarto fechado. Bem, como o assassino poderia cometer o crime neste aposento inacessível e fugir?

   Deixaram a Mica no quarto, aos cuidados da empregada. Alex ficou ao lado da amada nessa tarde. Já Yuki, que não tinha conhecimento dos fatos, só ficou sabendo que a garota tinha passado mal, nada mais.
   Do lado de fora do quarto, Camilla e Harumi conversavam, abaladas:
 — Isso parece ruim, Cá.
 — Eu não queria pensar nisso, mas a principal suspeita não é a Solange? Pois não a encontramos em lugar nenhum.
 — A propósito, ontem a Mica disse algo. Disse que no dia que brincamos na praia. Solomon e Solange estavam discutindo em um dos andares. E mais uma coisa, na noite passada eu fui ao banheiro durante o nosso jogo, não fui? Enquanto eu estava neste mesmo lugar a escutei conversando no telefone sobre algum passaporte, e se era possível tira-lo nessa semana.
 — Pensando bem, ela poderia estar organizando sua fuga para outro país. Mas e o quarto fechado? Nenhuma tentativa foi feita para fazer com que parecesse um suicídio. Não havia motivos para matá-lo em quarto fechado.

   De volta ao local do crime, ambas conversaram com o mordomo, que guardava a entrada do quarto.
 — Eu chamei a polícia e fui instruído a não permitir a entrada de ninguém. O tempo pode melhorar amanha à tarde, então suponho que eles cheguem por esta hora.
 — A porta ficou fechada à noite inteira?
 — Não sei, só tentei bater na porta. Solomon tem documentos relativos ao seu trabalho no quarto, então sou proibido de abrir a porta quando ele não responder.
 — Solomon e sua irmã não se relacionavam bem?
   O mordomo arregalou os olhos, espantado.
 — Eu também não sei disso. Trabalho aqui há apenas uma semana.
 — Uma semana?!
 — Eu e a empregada fomos contratados temporariamente. Nosso contrato é curto, de duas semanas nesse verão.
 — Foi só para esse resort então? Você não era empregado do Sol?
 — Isso mesmo. A respeito dos irmãos, só sei que Solange era empregada da empresa do seu irmão.

   “Tem algo errado... Harumi! Por que a saudade recíproca, se vocês nunca haviam se visto até chegarmos ao pier?”

sábado, 22 de outubro de 2011

74_ Crônicas além do mar V


O Sol Brando

   Foram todos deitar, mas as luzes não se apagaram, ninguém dormiu.
   Vararam a noite jogando cartas, desafios e contando histórias de terror a luz de uma lanterna fraca, acompanhadas com salgados e refrigerantes. Alguns desistiram da noitada. Cecília, alegando morrer de sono, foi a primeira a se deitar; Micaela e Alex deixaram o grupo logo depois e migraram para outro quarto, à procura de privacidade.
   Na ordem, Yuki, Harumi e Camilla se foram, mas não descansaram o suficiente para o próximo dia.

   Eram cerca de oito horas e o mordomo acordou a todos, um pouco pávido.
— Algum problema, senhor?
— Sim. Nossa empregada foi ao quarto da Solange, mas ela não estava lá. Também não havia sinais de que ela dormiu lá, e procura-la nos lugares costumeiros não nos levou a nada.
   Camilla estranhou.
— E que tal perguntarmos ao Solomon?
— Tentamos contatar o quarto dele pelo interfone, mas não obtivemos resposta.
— Então Solange está desaparecida e Solomon não responde as ligações?
— Resumindo, é isso que está acontecendo.
   Há essa hora, o grupo se olhou.
— Que tal entrarmos no quarto dele então? Você não tem a chave?
— O quarto do mestre é uma exceção. Ele guarda seus documentos de trabalho lá. Não temos autorização de entrar lá, e apenas ele tem a chave mestre.
   Com um leve cutucão, Harumi disse à Camilla tudo que queria dizer, mas não tinha idéia de como o fazer na frente do mordomo. Ela compreendeu.
— É melhor irmos lá ver. Harumi, Mica, Alex, venham comigo. Yuki, fique aqui com a Cecília.
   Camilla tomou a vanguarda, mas como não conhecia o hotel então estacou no primeiro corredor do terceiro andar. Como uma flecha, Harumi passou do seu lado em direção ao quarto certo.
   Quando todos chegaram, o mordomo, ofegante, tentou abrir a porta em vão. Eles nem ao menos resposta do outro lado obtiveram. Não havia idéia do que fazer, até Alex ter o brilhante pensamento.
 — Temos que arrombar.
   Consentiram com a cabeça. Ambos (ele e o mordomo) forçaram a porta três vezes com o corpo, e na quarta ela se rendeu. Com a força aplicada, todos foram parar no chão.
   Foi ao olhar para cima e para frente que o garoto realmente despencou. Na porta, as garotas tiveram a mesma vista...
   Solomon jazia no chão com uma faca fincada ao peito.    

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

73_ Crônicas além do mar IV


Royal Straight Flush

   Chovia muito lá fora e as ondas pareciam bem mais fortes do que o máximo aceitável para usarem o barco. Ninguém acordara disposto e nem mesmo o desjejum trouxe energia para encarar o dia. Solomon, por exemplo, não estava na mesa junto com os outros.
 — Meu mestre não é alguém que acorde cedo, isso é difícil. Sua ausência nesta manhã é rude, mas espero que vocês compreendam.
   Incapazes de sair, passaram o dia inteiro na sala de jogos, no subsolo. Tênis de mesa, sinuca, xadrez, dardos, pebolim e até um canto tranquilo para Harumi terminar seu livro.
 — Parece que vocês estão se divertindo.
   Solomon entrou na sala com um grande sorriso no rosto, muito típico. Solange vinha logo atrás, cumprimentou a todos e perguntou se poderia ingressar no jogo. Camilla, já de pé, ofereceu seu lugar na mesa de pôquer.
 — Estamos jogando Texas Hold’em. Temos um flush na mão, mas acho que a Micaela está blefando.
   Alguns minutos bastaram para provar que Solange sabia manipular muito bem. Ao mesmo tempo em que ela abraçou todas as fichas da mesa com um belíssimo Royal Straight Flush, seu irmão se despedia dos jovens (tinha algumas coisas a fazer). Guardou sua caderneta no bolso da camisa e caminhava em direção a saída, mas advertiu-os:
— Preciso organizar meus trabalhos, então estou indo embora. Amanha pode ser que nós joguemos outros jogos*.
   Já era tarde, então concordaram em ir para os quartos.

[* Desculpem-me se a concordância estiver errada, e novamente pela crônica tardia.]

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

72_ Crônicas além do mar III


Discussão, Declínio...

   A água cristalina e quente trouxe calma e diversão para todos: Yuki ajudava Cecília na construção de um castelo de areia, Harumi lia uma edição de Sherlock Holmes, Micaela e Alex trocavam carícias sob um guarda sol e, distante de todos, Camilla boiava acompanhando a calmaria. Todos tinham o que precisava: diversão, amigos, amados, um bom livro e um ótimo local para relaxar. Mesmo duas pessoas discutindo num dos quartos do hotel além da vista dos jovens fora facilmente.
   O jantar foi igualmente especial e todos aprovaram. Foi feito para cada tipo de gosto diferente, desde as iguarias japonesas às refeições latinas.
 — Senhor Solomon, este jantar está divino! Quem o preparou?
 — Nosso mordomo também é cozinheiro. Incrível não?
 — Gostaria de agradecê-lo.
 — Seria uma honra, minha jovem.

   Para desespero dos hospedes, o noticiário anunciava a vinda de um tufão. Harumi dizia que tempestades nessa época do ano vêm e vão sem aviso, mas não sabia informar em quantos dias ela iria embora.

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

71_ Crônicas além do mar II


A Chegada À Ilha

   O mordomo e a empregada estavam no porto quando o navio chegou. O grupo desceu e foi de encontro à dupla de subordinados,
 — Prazer em vê-los, especialmente a senhorita Harumi, estávamos com saudade.
 — Igualmente. Perdoem-nos por importuná-los.
 — Não se preocupe, pois nós que devemos pedir desculpas: demorará cerca de uma hora nessa lancha para chegarmos ao hotel do meu mestre.
   Não levaram mais de trinta minutos do porto à ilha, e quando chegaram bem próximo, uma moça ajudou a amarrar a lancha ao píer. Não falou com os outros convidados, mas sorriu ao ver Harumi.
 — Essa é a irmã mais jovem do mestre, Solange, e também passará uma semana aqui. Eu já a vi uma vez antes, faz algum tempo.
 — Mas Harumi, você devia ter dito isso antes. Foi a primeira vez que ouvimos você falar de outros hóspedes.
 — Desculpem. Agora vamos lá conhecer o dono do hotel.
   Todos deram alguns passos, mas o mordomo disse que não precisavam subir até o hotel; Solomon já estava a caminho quando recebeu a notícia que os convidados haviam chegado. Mais alguns minutos e a figura de um senhor alto surgiu ao pé de uma árvore. Apesar de ser um professor de universidade, vestia uma camiseta havaiana e um shorts, nada formal para a ocasião.
 — Sejam todos bem vindos.
 — Senhor Solomon, obrigada por nos deixarem ficar aqui. Agradecemos pela oportunidade de ficar em um hotel tão magnífico!
 — Ora, você é bem diferente daquela Camilla descrita pela Harumi. Agora vamos entrar, não precisamos ficar aqui em pé o dia todo. Vocês podem pegar um quarto para cada e tomar um banho de mar antes do almoço. Só peço para que não se atrasem, e nem percam a chave do quarto.

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

70_ Crônicas além do mar I

O Navio

   Camilla estava realmente interessada em levar sua priminha ao hote, porém seus tios não permitiam. Mas ao erguer a bolsa de viagem e perceber que ela estava pesada demais para algumas peças de roupas que o passaporte da garotinha se confirmou: Cecília estava dentro dela, foi então seus pais cederam. Foi difícil contar isso para a amiga , dizer que não levaria sua prima, mas foi um único sorriso que a fez desconsiderar o fato.
   A viagem até a ilha estava toda organizada, por sua vez. Harumi e sua irmã Yuki eram as responsáveis. Camilla, sua prima Cecília, Mica e seu namorado Alex eram os convidados. Todos pegariam um navio até um arquipélago, e de lá mais um barco particular, totalizando sete horas de viagem. Enquanto isso, o grupo fazia de um baralho seu passatempo predileto.
 — Camilla, eu nunca estive lá de fato, mas pesquisei sobre o hotel. Também conversei com o dono, senhor Solomon, e ele disponibilizou um mordomo e uma empregada que estarão nos esperando. Opa, eu bati! Quem perder vai pagar a bebida. Vou querer um suco de frutas.
   Agora o jogo tornou-se emocionante; Eram apenas três jogadoras, mas duas já estavam com a mão feita. Cecília foi a primeira a abaixar as cartas:
 — Quero Coca-Cola!
 — Certo Cecí. E eu vou querer um chá verde.
 — Micaela, não peça nada antes de terminar.
 — Calma, “Cacá”... Você não vai precisar ir tão longe para comprar. Temos uma máquina de refrigerantes logo ali.
   Mica não era uma pessoa necessariamente má, mas seu jeito sarcástico a incomodava algumas vezes. Ela mal havia terminado de implicar, e nossa garota já estava à procura da tal máquina.

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

69_ Fio de esperança na cerração


   O seu celular tocou, e então um sorriso acanhado apareceu. Era uma amiga (aquela que a convidou para dormir em seu apartamento), e também tinha um presente para Camilla. O que precisavam fazer era se encontrar. Disse também para se preparar, e desejou muitas felicidades.
   Um fio de esperança na cerração. Mas tudo se quebra, até mesmo as pessoas que nunca se esgotam eventualmente têm um colapso. Naquela hora, a pequena caminhava de volta para casa pelo trajeto mais longo, como sempre fez quando não queria encarar a realidade. Tinha receio de chegar cedo e encontrar alguma solenidade preparada pelos seus pais, além dos possíveis mimos que sofreria, então não levaria a culpa por estar com eles. Ou pior, rostos que a acorda quando fecha os olhos; rostos que a observou toda vez que disse a verdade; rostos que riram de cada vez que ela caiu.
   Essa fobia permaneceu durante todo o percurso, e só foi se acalmar quando viu a face alegre com quem dividia a amizade recíproca. Seu pescoço ostentava um pequeno colar em formato de coração que, quando aberto, mostrava a Constelação de Gêmeos.
 — Mas é claro que eu adorei esse presente! Agora estou retribuindo! Quero que vá comigo para um hotel que eu conheci nessas férias. Vamos comemorar seu aniversário lá, longe desses que você não suporta. Prometo que, em uma semana, você voltará para casa satisfeita e com a mente curada.

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

68_ Trocando de estação II


   Mesmo o final do mês assustando mais que o fim do mundo, ninguém estava realmente preocupado. E se estavam, não demonstraram ao amanhecer. Mas com o passar do tempo, seus atos mudaram, e agora as pessoas já não suportavam se encarar. Os empregos ficaram insuportaveis e o trânsito tornou-se um inferno; dar o acento para uma idosa no ônibus era tão impossível quanto ser atendido em uma fila de supermercado.
   A garota voltava para casa após um dia cansativo, porém tudo havia mudado, e uma mancha cobriu seu coração a deixando extremamente infeliz. O amor ficou dividido pelo ódio e aquela sensação de não encontrar seu caminho surgiu. A partir de então ela começou a acreditar que o mundo não tinha mais salvação. Se essa tal sociedade utópica fosse alcançável, ela não queria participar. Se fosse um sonho, gostaria de sonhar com essa vida longe dela.
   Foi descobrir mais tarde que tudo aquilo não passou de um dia normal para todos; simplesmente tinha acordado animada, mas seu vigor sumiu na medida em que voltava para casa. Começou a comparar hoje com ontem, anteontem e a semana passada, mas só encontrou defeitos neste dia.

 — Como hoje pôde ser um dia tão ruim de se viver?

   Não era um dia normal para ela, nem especial aos desconhecidos. Era simplesmente seu aniversário.

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

67_ Trocando de estação I


   Camilla estava a caminho da escola, mas parou para observar as pessoas (nessa cena de teatro ela joga o protagonista, mas também o oposto) procurando por mais do que os olhos podem ver, para acreditar em alguma coisa. Não via as pessoas de cima, e muito menos de baixo, mas se as conhecesse, talvez pudesse crer nelas. Era difícil de dizer o que chamou sua atenção, mas todos levantaram bem cedo, e igualmente dispostos. Apresentavam um sorriso decente e as mais simpáticas atitudes: davam passagem, pediam licença e até se desculpavam!
   Estranho. Tudo estava perfeito demais, mesmo com essa sociedade utópica não passando de sonhos e teorias...

[Prometo que o próximo capítulo fará sentido.]

sábado, 1 de outubro de 2011

66_ O mal da adolescência


   Suas novas tatuagens são de caneta preta. Seus vícios são os chocolates. A heroína é sua mãe; o crack, seu pai... Seus momentos “mal acompanhados” são geralmente com amigos. A sua prisão é o quarto peculiar e a maior pena, o próprio castigo.
   Do quarto, Camilla migrou à sala, depois ao jardim, onde deitou na relva verde e lá ficou por alguns instantes. Todos viam uma garota jogada ali, mas ninguém escutava seus mais profundos suspiros. Ela queria simplesmente ser uma criança novamente, mas não no sentido assustador; queria brincar com suas amigas de infância e jogar vídeo game, sem se preocupar por estar desperdiçando sua vida, mesmo com os dias parecendo longos... Agora ela convive com os ecos atrás da sua cabeça, dizendo sempre as mesmas palavras: cresça, e amadureça.

   Foi um lindo sonho, ela só estava se lembrando errado.