"E tu, bondosa alma, que te sentes tão angustiada como ela...
Consola-te com os seus sofrimentos, e permite que esta pequena personagem se torne sua amiga
(com todo vosso zelo e compaixão) que, por destino ou culpa própria, não tiveres outro mais próximo.
Não poderei recusar vossa admiração e amor para essa alma, nem ao seu caráter.
E com lágrimas, acompanhe o seu destino."

Sofrimentos do Jovem Werther (Primeiro Livro) - Goethe

terça-feira, 31 de maio de 2011

12_ Lares despedaçados

   Camilla já conseguia ver sua casa após a última esquina, e um sentimento de satisfação misturado com medo tomou conta dela. Um dos seus objetivos já havia sido cumprido, agora precisava entrar e esclarecer a situação aos seus pais. Procurou as palavras mais fáceis de usar na hora e algumas reservas, caso esquecesse as essenciais. Não queria bolar um argumento à sua defesa, pois sabia que tinha agido sem pensar naquela manhã, e queria que, simplesmente, os pais entendessem a conclusão que a filha encontrou após deixá-los. Caso precisasse, citaria as lições que aprendera durante seu tempo ausente na casa.
   Mal sabia ela que todo o conhecimento adquirido naquele prostíbulo seria inútil, levando em consideração seu lar. Este estaria longe de toda realidade, de todo o correto. Não rezavam nem agradeciam pelo jantar havia semanas; a luxúria tomou conta do recinto, talvez mais abundante aqui do que no alcoice. Ela descobriria, futuramente, que seu lar está quebrado, e talvez sempre tenha sido, mas esteve ocupada demais para perceber isso.
    Resolveu entrar na casa, e encarar seus familiares. Era o que ela esperava, mas surpreendeu-se quando não encontrou ninguém a sua espera, nem ao menos um bilhete avisando-lhe caso ela voltasse pra casa. Ao mesmo tempo, conseguiu ficar alegre por ter evitado uma bronca, mas vazia por não poder dividir a experiência vivida com ninguém. Ninguém, a não ser seu melhor amigo.

   “Diário, finalmente nós chegamos em casa. Digo finalmente não pela exaustão ou pelo tempo que passamos fora, mas pelo excesso de aprendizado que conseguimos aproveitar hoje.
   Bem, obrigada por me acompanhar, mas preciso ir. Creio que você saiba a quanto cansada eu estou. E sim, estou feliz em rabiscá-lo novamente.”

   Abraçou-o com todas as forças que ainda lhe restavam, virou o corpo e acabou dormindo na varanda de casa. Ia sonhar com todas as coisas fascinantes vistas, desde as passagens bíblicas da igreja até os mais eruditos pensamentos da mais nova amiga no bordel. Sua noite seria incrível, mas duraria apenas isso... Outra tempestade estava a caminho.

segunda-feira, 30 de maio de 2011

11_ O outro lado da realidade

   Não se havia nem quatro quadras de diferença a basílica, e sua atenção voltou-se para uma casa iluminada apenas pelas luzes de uns néons rosas e azuis formando a palavra Night Club. Nunca tinha passado por essa rua antes, e indagou se realmente deveria ser estreada. Olhou para o lado desértico da rua, e na outra extremidade, um grupo de pessoas paradas na esquina que a observavam. Chegou à conclusão que por aquela direção não poderia voltar. Atravessou a calçada da casa chamativa, e uma mulher iniciou um dialogo com nossa heroína: 
— Ei, psiu! Seu corpo renderia uns bons trocados hein?
— Ãhn? Como assim?
— Quantos anos você tem?
— Bem, faço 17 daqui a dois meses, por quê?
— Não quer trabalhar e conhecer novas pessoas?
— Ahh, não... Não tenho vocação pra trabalhos ainda.
— Quem disse que precisa de vocação? Se quiser, ensino alguns truques e te apresento ao meu patrão agorinha mesmo.

   Não houve ninguém na vida dessa mulher para mostrar a diferença entre o certo e o errado, e talvez Camilla também não tivesse quem conversaria sobre o mesmo assunto. Passaram um bom tempo discutindo essa questão, até que a meretriz chegou ao tema da necessidade financeira. Precisava pagar sua faculdade, e um amigo mais velho sabia alguns meios de conseguir o dinheiro, e desde então, trabalha pra ele. 
— Foi ele quem me colocou no “mercado de trabalho”. Alias, eu e minhas colegas devemos muito a ele.
— Quer dizer que você tem várias amigas?
— Na verdade não... Essas querem tomar meu lugar!
— Mas por que tanta disputa?
— Deste inferno, eu sou a mais requisitada pra satisfazer os desejos
— Isso deve ser um pouco chato, não deve?
— Isso é um saco! Sabe o que é ser a preferida?

  Na verdade, Camilla não sabia. Tentou desviar olhar e usar a imaginação para fugir daquele canto, mas os néons pregaram os seus pés ao chão, mostrando o outro lado da realidade... 
— Obrigada pelo papo, mas eu preciso ir agora...
— Bem, se você mudar de idéia, sabe onde me encontrar, né? Você pode começar com os mais jovens e quem...
— Não voltarei!

   Ambas se olharam com um ar de desprezo, mas entenderam que isso só se passava de pontos de vista diferentes. 
— Desculpa, me exaltei.
— Eu que peço desculpas, olha só onde estou te metendo. Agora vá, seus pais devem estar te esperando.
— Quem sabe...

   Quinze minutos depois, andando pela avenida a seiscentos metros de casa, Camilla se lembrou das palavras da mais nova amiga, sábias de mais para sua função social: “Não subestime os sentimentos da sua família; Você tem alguém que te ama, diferente de mim, que só tenho a quem amar”.

domingo, 29 de maio de 2011

10_ Edifício das pedras vivas (Pedro 2:5)



   Era aproximadamente sete e meia da noite, o vento gelado (principalmente) fazia seus olhos lacrimejarem, quando passou na frente de um prédio com duas torres altíssimas e vários vitrais com a imagem de um senhor , que a primeira vista parecia muito bondoso. Apesar de não conhecer uma religião de fato, decidiu entrar escutar um pouco, mesmo que fosse atrasar seu compromisso.
   Havia ali várias pessoas de mão dadas, e mesmo sem entender o que se passava, achou magnífico um lugar onde havia essa confraternização. Ouvia-as dizendo sobre uma sentença o que, segundo elas, estaria próximo: “A boca do Justo se prepara para falar sobre sabedoria e Sua língua proclamará o julgamento”. Também conseguiu escutar nitidamente: “Bem Aventurado o homem que suporta a tentação, pois quando for reconhecido como bom, receberá a coroa da vida!”
   Sentiu-se satisfeita, pois finalmente, depois de um dia inteiro caminhando pela metrópole, encontrou um local onde as pessoas agradeciam por mais um dia de vida, pela sua saúde e pelas dificuldades diárias que foram vencidas. Mesmo nunca ter olhado pro teto como os demais fizeram, sentiu que não fosse necessário, pois suas intenções sempre foram as mais justas possíveis. Nesse instante, um senhor de idade avançada lhe dirigiu a palavra, mas de uma maneira muito aconchegante, mesmo por causa do frio que fazia ali na porta:
— Quão serena, quão benigna e sorridente! Creio que esta seja a sua primeira visita à Casa do Senhor! Seja bem vinda e sinta-se em casa!

  Nesse momento, lembrou-se da desigualdade do seu lar, e que mesmo que fosse tão diferente, ainda era o seu. Com toda a educação possível do mundo, agradeceu a hospitalidade e se despediu. Num caminhar vertiginoso, alguns segundos depois, escutou o anacoreta ponderar, com toda sabedoria do mundo e soprar:
— Senhor, chama divina, tenha Piedade...

  Ela não conseguiu desvendar o significado da expressão, mas deduziu que este era o único desacerto da noite.

sábado, 28 de maio de 2011

09_ Redenção

   A história começa quando seus pais disseram “Ela não pode ser encontrada”. Os dias tornaram-se noite; os corações, espaços vazios... Do outro lado da cidade, finalmente ela enxergou quem eram aqueles a quem pedia benção durante tanto tempo, descobriu as intenções da família e ao mesmo tempo, se sentiu confusa por ter esse sobrenome. Talvez ela pensasse menos sobre eles, se eles dissessem que realmente se importam. Mas não é tão fácil assim: talvez haja mais vida fugindo da realidade.
   Aproveitou a noite para relaxar, caminhar um pouco e observar a paisagem da cidade acinzentada pela fuligem das chaminés. Em uma das mãos, seus sapatos estavam um dentro do outro, e noutra, seu diário. Tentou lhe perguntar sobre algumas coisas, mas já sabia quais questões ele ia responder, e como as responderia.

Camilla: Diário, como pude ser tão cega durante tanto tempo?
Diário: Minha amada, essa decepção é apenas um capítulo, e mais tarde você vai rasgar as páginas de ontem.
Camilla: Não! Essa desilusão é meu horizonte...
Diário: ...Então você está pronta para o pôr do sol?

   Tinha em mente que isso não ia durar muito. Havia tempo para dizer o que pensava sobre o assunto, e nada a perder se o fizesse.

Diário: Quer que eu desamarre as suas mãos, Camilla?
Camilla: Pra que?
Diário: Para jogar fora os inimigos de ontem e aliviar as memórias que vêm dessa maneira! Há uma vida bem melhor agora, e você sabe que estou do seu lado!

   Hesitante, enquanto o mundo está apenas um passo longe de recriar toda a sua inocência, decidiu encarar a realidade e deixar esse tema pra outrora, independente do tempo que possa levar. Agora ela estava bem acordada, e fez por merecer: queria apenas voltar para casa, e expor seus sentimentos aos pais. Devia tudo isso ao seu companheiro, apesar de ser uma criança voluntariosa que carregava o peso do mundo em seus braços, junto com seus sapatos.

sexta-feira, 27 de maio de 2011

08_ Erros e opróbrios

   Camilla se sentiu como uma burguesa: idolatrada pela mediocracia, odiada pela alta-nobreza; mas ela queria ser apenas um sans-culotte, cansada de sustentar os bacanais da nobreza, a ponto de causar uma revolução, liderada pela jovem iluminada e descobrir que pensadores livres são perigosos. Mal sabe ela que seus ideais repercutiram de uma maneira escandalosa - dividiu a opinião dos familiares, e alguns até a apoiaram.
   Era apenas uma manhã rotineira para todos da vizinhança, e logo percebeu o cenário pré-apocalíptico se formando. As consequências já chegaram ao seu lar, e sabia que seus pais viriam repreendê-la. Levantou-se rapidamente, mas parou ao perceber que estava rodeada por paredes que a limitam, e que estaria debaixo quando essas desmoronarem. Tinha vontade de sumir dali, mas precisava assumir seus atos, dizer ao pai que não era sua intenção desrespeitar a autoridade do seu irmão.
   Refletiu também sobre a sua família, e chegou à conclusão que eles não passavam de meros seres que se concentram integralmente na etiqueta, e em contrapartida, buscam, ano após ano, somente um lugar mais próximo à cabeceira da mesa nos almoços de domingo. Irmãos discutiam com primos por bens materiais, tios altercavam com sobrinhos, pais contestavam a mente dos filhos... Não era essa a atmosfera que ela queria. Por último, relembrou da priminha, que se tivesse sorte no futuro, teria uma vida melhor.
   Pegou algumas camisetas, uns shorts e um par de meias, embolou tudo, jogou dentro da bolsa, secou as lágrimas que escaparam dos olhos, guardou o Diário embaixo do braço e fugiu de casa... Sem dinheiro, nem família, sem identidade, nem destino.

quinta-feira, 26 de maio de 2011

07_ Buffet de gente grande

   "Boa noite Querido Diário. Fui convidada ontem às pressas para um jantar de família e infelizmente não pude tê-lo como acompanhante. Reencontrei uma boa parte dos meus entes queridos, que mesmo morando longe, se preocupam em ligar e fazem questão de nos visitar aos fins de semana. Várias fotografias gravaram nossa noite, e aposto tudo que tenho em que todas elas vão para algum álbum, em algum site de relacionamentos, de alguma prima próxima.
   Porém, um acontecimento acabou com meu espírito. Minha priminha, de apenas doze anos, ingênua como toda garota mais velha deveria ser, chamou mais atenção que algumas ciumentas (talvez mal-educadas, mas não tenho certeza), que no ápice da brincadeira de Ciranda, deixaram a pobre garotinha isolada numa mesa, enquanto elas se divertiam rodando e sorrindo. Seus pais, ao verem isso, apenas balançaram a cabeça, resmungando algumas palavras e alegando isso ser comum e que ela ficara afastada por opção.
   Diário, instantaneamente meus olhos se encheram. Não compreendo como ninguém possa amar aquela criaturinha como ela tem o direito de ser amada, enquanto eu, somente eu a amo com tanta ternura, tão profundamente, não pensando em outra coisa, querendo que ela apenas fosse feliz.
   Bem, ao reler essa página, vi que me esqueci de lhe contar o final da história: os pais dela vieram me perguntar o motivo de tanta revolta. Disseram-me que toda criança deve sentir e se acostumar com a dor do mundo às vezes, pois o mundo não é um mar de rosas, e eu me perguntei como monstros assim poderiam ter uma filha tão dócil e linda...
   'Dor do mundo...' esse sentimento vive e existe na forma mais pura entre as pessoas que chamamos gentilmente de incultos e rudes! Eles não sabem o significado dessa expressão! Eu sou a prova viva do sofrimento, e não desejo isso nem a eles.
   Ahh, Diário... Agora estou inconformada com esse ato desumano! Se eu pudesse, adotaria essa pequena alma e lhe daria todo o amor do mundo."

quarta-feira, 25 de maio de 2011

06_ Lágrimas e chuva

   Diário, meu Querido Diário, preciso te contar sobre a melancolia deste lar; já se faz dois dias que a tempestade investe contra a janela do meu quarto e mesmo ela sendo típica dessa época do ano, ainda não estou acostumada, e minhas peregrinações estão suspensas.
   Ontem à noite tomei a decisão de assistir o nascer do sol, magnífico e grandioso como sempre, diretamente da minha sacada, mas infelizmente não consegui levantar da cama a tempo. Durante o dia, propus-me a sentir o vigor de contemplar o luar, mas, afinal, permaneço agora no meu quarto, observando os pingos de chuva escorregarem do lado de fora do vidro. Não sei bem por que me levanto de manhã e por que vou dormir a noite. Essa intempérie tornou meus sentidos mais áridos e secos. Porem Diário, por mais que o clima do logradouro em frente à minha casa pareça hostil, meu quarto ainda aparenta ser muito confortável e não pode ser pior que lá fora, ou vice-versa, então está tudo bem.

terça-feira, 24 de maio de 2011

05_ Boderline - Fronteira

   "Meu Querido Diário às vezes me pergunto se eu te faço sofrer, desabafando-me e entupindo-o de sentimentos que parecem ser sazonais. Desculpe me se realmente faço isso, não é de proposito... Deve ser por causa de a minha vida ser muito romântica (e os homens me chamarem de Cortesã), mas você conhece algum romance onde a mulher recebe uma segunda chance pelos seus atos?
   Eu lhe imploro, não sinta dó de mim, pois não sou digna de pena, e isso só pode te angustiar, ou quem sabe mudar a sua opinião sobre mim. Então não faça isso, não faça nada, por favor! Gostaria que nossa relação continuasse dessa maneira. Você é único, e eu não consigo me sentir sozinha ao seu lado, principalmente durante os maus momentos; conversamos sobre coisas que eles não entenderiam, sempre com cores que nunca irão desbotar.
   Mas durante todo esse tempo eu pensei que nós simplesmente envelheceríamos e nunca mais iríamos nos encontrar, porquê existem pessoas que decidem compartilhar seus medo e suas angústias com seus respectivos melhores amigos, pois querem simplesmente desabafar, ou quem sabe tirar a tristeza dos seus corações e no primeiro sinal de alegria e felicidade na vida eles perdem o sentido para compartilhar suas vidas.

   Querido Diário, imploro-lhe perdão, mas desta vez por comparar nosso relacionamento com outro qualquer!"

segunda-feira, 23 de maio de 2011

04_ Falta de tempo

  Tanta coisa para eu te dizer e tão pouco tempo pra lhe explicar o que eu sinto. Dizer que você só vê as coisas do modo que quer vê-las. Há sentido em tudo isso que você faz? Você conseguiu todo o entendimento do mundo enquanto eu fiquei confusa. Como você fez isto?

   Você não entende, quando eu tento te explicar, porque você sabe disto tudo e eu suponho que as coisas não mudarão. Em sua mente eu sou simplesmente cega e você tem razão o tempo todo. O tempo todo! Se eu penso por mim, você acha que estou fora da linha. Eu não sou quem você é! Eu não sou quem você quer! E eu não serei o que você espera que eu seja!
   Mas saiba que estou muito arrependida....
   Eu não posso fazer nada direito? Você não me conhece. Se quizer, fique fora de minha vida, mas não me chute enquanto eu estiver sozinha. Tentei tanto não fugir e mesmo com as coisas não acontecendo do meu jeito, eu continuarei sendo a mesma.
  Mas Diário, você é adorável, tão simpático! Você é perfeito em todos os sentidos! Meu interior congelou, uma lágrima fria escorreu pelo meu rosto, e eu me sinto muito arrependida...

  Obs: Devo agradecer à aquela que conseguiu sarar seu próprio coração, enferrujando  o de terceiros. Fique em Paz.

domingo, 22 de maio de 2011

03_ Teatro da minha vida

   Hoje não foi um dia fácil... O relógio marca 13 minutos para a meia-noite e já é o segundo copo com açúcar que tomo em menos de 1 hora. A lua deixa sua marca no chão, e sua luz me convida para uma caminhada.
   Antes de sair, junto meus documentos e um pouco de dinheiro, só por hábito. Peguei meu Diário que geralmente fica em cima da escrivaninha, rasguei a última folha e escrevi alguma coisa para meus pais, pedindo pra que eles não se preocupem comigo.
   Em cima de um viaduto, sem a intenção de voltar para casa, observo as luzes que vão se apagando com o passar do tempo, a lua que se esconde por entre as nuvens e a gélida brisa que vem do leste. Saco meu inseparável companheiro da mochila e começo a dialogar sobre essa noite perfeita:

Camilla: Sabemos que esta é uma cidade enorme e nunca é a mesma coisa, ela jamais pode ser muito bonita.
Diário: Camilla, doce Camilla... Seria inapropriado se eu fosse simplesmente corajoso e dissesse: "você seria minha"?...
Camilla: Porque você talvez seja um pedinte e eu a rainha da minha vida?
Diário: ...por que sei que talvez esteja deprimida, mas ainda estou pronto pra conversar.
Camilla: Agora já são 3 horas em ponto, a hora é só o tempo que leva até você falar...
Diário: Então se você está sozinha, porque você não diz que está solitária?
Camilla: Ah, eu sou uma menina tola. Eu sei, foi o que ouvi dizerem.
Diário: Que é típico seu ir e vir... 
Camilla: Mas Diário, vocês nem me conhecem!
Diário: É doce de a sua parte tentar me surpreender, ai meu Deus, você me conquistou! Uma garota como você é simplesmente irresistível. Bem esta é uma cidade enorme e todas as luzes estão apagadas, mas até onde eu posso fazer, sabe, saber de você...
CamillaDiárioQuerido Diário... Eu devo confessar, meu coração está tão quebrado, deixado aos pedaços, e minha cabeça está uma bagunça.
Diário: Garota, já são quatro na manhã, e você esta andando por aí ao lado dos fantasmas alucinados que um dia cometeram um erro.
Camilla: E eu mesma me enlouqueço por causa das coisas que fiz.
Diário: Então se você é louca ou não, eu não me importo, pois você me surpreende! Mas você é uma garota tola!
Camilla: Se eu morro, você sorri, você ri... Eu choro...
Diário: ...e somente! Uma menina como você não poderia ser solitária. É uma vergonha se você pensasse o mesmo...
Camilla: E como uma garota como eu pode ser simplesmente irresistível?

Já era costume meu personificar meu companheiro de bordo nessas noites e eu não esperava por sua última resposta. Antes de voltar para meu lar, me despeço da lua, uma das razões dessa peregrinação.

sábado, 21 de maio de 2011

02_ Introdução a Camilla Saentinni

“Onde está minha educação nessas horas?” Ao mesmo tempo em que me desculpo Querido Diário, pergunto se realmente deveria voltar atrás e me apresentar, ou se você já me conhece o suficiente para evitar minhas condolências.

   Dane-se, não consigo me conformar com impessoalidade barata. Mesmo com estado de espírito ferido, ainda tenho uma identidade, e não posso (nem devo) simplesmente aceitar algo infiel quanto a minha pessoa, desde que seja proposto por mentes medíocres, como por exemplo, uma “garota que se torna viva quando você tira sua roupa”, ou que ela se sente “confortável caída de joelhos”. Por isso, se você se encaixa nessa descrição, não saia gritando “Você não acredita nas histórias que me contaram sobre uma garota que eu conheço!”.
   Então vou deixar aqui meu “Olá” e penetrar em suas mentes. Claro que não sofri o suficiente na minha vida, em contrapartida, chorei demais para minha idade (sofrer assim com apenas 16 anos não é normal)... o fim de um relacionamento que se dizia ser eterno, mesclado com um ciúmes fortíssimo e uma esperança de que um dia possam reatar me magoam profundamente (e diariamente, pra ser sincera) pois não fica claro que esse reencontro é inviável. Mas o que realmente construiu os alicerces dessa angústia foi perder o amor da minha vida. Essa é, sem dúvida nenhuma, a maior dor que se pode encarar, e dificilmente você sobreviverá a ela sem demonstrar nenhuma sequela.
   Enfim, minha pessoa está definida oficialmente neste caderno. Meus sentimentos e minhas ilusões estão a caminho para completar a novela da minha vida. Despeço-me para uma data qualquer, com um singelo adeus.
   Mas fique tranqüilo, Querido Diário... Este adeus não é decisivo.

01_ Diário, posso ter toda a sua atenção?

Querido Diário, você clama por uma verdade? Se eu te contar, você lutaria por uma mentira. Como nós não temos muito tempo (mas temos tempo o suficiente), eis a descrição surrealista de uma mente conturbada:



   "Começou em uma noite, e tornou-se uma aventura. Não me sentira assim desde quando meu primeiro romance acabou (foi esse quem levou embora a essência de um coraçãozinho feliz) e não me deixava dormir a noite, implorando por uma última dança com minha alma gêmea. Perfeita para sobreviver eternamente, perfeita demais para a morte nos separar.
   De certo que todos os contos de fada começam com um 'Era Uma Vez...' e terminavam sempre com um final feliz, mas Querido Diário, e se eu te contar que a minha história não é nada parecida? O universo está cheio de pontos de vista diferentes, alguns são certos e outros, errados. Não foi apenas 'Uma Vez', e sim várias vezes que me fizeram sentir dessa forma, tentando escapar da realidade: menosprezada e subjugada, um pouco abatida e angustiada, invisível pela maioria dos olhos. É isso que eu recebo pelas escolhas que fiz, ou pelos pecados cometidos? Por que é que aquilo que faz a felicidade do homem acaba sendo, igualmente, a fonte de suas desgraças? Bem, não me adianta resolver esses enigmas (pois os conheço suficiente e não vou a lugar nenhum com ou sem eles) e essas serão minhas cicatrizes, tenho de conviver com elas. Agora pire na minha loucura (não importa se eu ligo, está tudo dentro de minha mente) e antes de iniciar, como se diz 'Adeus', quando dificilmente dizemos 'Olá'?"