Camilla não voltou para casa, não estava satisfeita. Pelo contrário, ainda precisava de alguém pra conversar. Não podia ser seu diário, pois esse sabia muito de muitas coisas. Pensou então nos tios, mas seria muito hipócrita se retornasse lá. Procurou um meio termo, mas a sua amiga estava ocupada no trabalho. Foi nesse instante que ela se lembrou do senhor da igreja. Não mudou o caminho, pois estava andando sem direção. Apenas virou algumas ruas e já conseguia visualizar a basílica. Qualquer um tomaria aquela construção gótica como algo assombroso agora sem iluminação. Suas torres já se perdiam nas nuvens e o saguão estava deserto. Passou um tempo olhando para os mesmo vitrais que viu quando entrou pela primeira vez e sentiu um pouco de medo: a igreja estava sombria demais!
Um senhor curvado pela idade fez um gesto com as mãos, chamando a garota para o altar. Ela o reconheceu, era aquele senhor hospitaleiro que lhe deu as boas vindas. Estava feliz por revê-lo são e salvo depois te tantos dias e mais ainda por saber que a recíproca era verdadeira. Sem perder tempo, perguntou se o ancião estava ocupado para uma conversa, e ele aceitou com todo prazer.
— O que houve minha filha, por que estás aqui?
— Eu precisava de alguém para me aconselhar, me mostrar o caminho certo das coisas.
— E você tem certeza que veio ao lugar certo, né?
A garota estava com medo de citar a ida ao bordel, mas só afirmou com a cabeça. Não queria que o senhor pensasse outra coisa, não que ele fosse julgá-la.
— Pois bem filha, nossa igreja está aberta a todos que precisam de ajuda.
— Mas porque ela está tão vazia?
— Ahh Camilla, não saberei te explicar. São as vontades carnais, e algumas pessoas se entregam a elas.
— E o senhor conversa com essas pessoas que não estão aqui?
— Para não mentir, muitas que estão ausentes hoje virão ao culto de amanhã.
— E quais são essas vontades carnais?
— São todas as vontades do corpo que comprometem o espírito. Como exemplo, vários homens daqui frequentam o bordel a noite, enquanto de manhã vêm ser perdoados.
Camilla sabia que não deveria ter ido aquele local imundo, mas não sabia que era tão errado assim. Lá as pessoas se sentem felizes e satisfeitas, e como isso pode ser errado? Gostaria de fazer essa e várias outras perguntas ao homem, mas talvez ele não soubesse responder todas. Seus pensamentos estavam longe daquele altar. Honestamente, estava focada nos quartos imundos e o odor de suor daquele prostíbulo. Foi então que o arcebispo interrompeu suas idéias com seu questionário. Mesmo sem intenção, deixou a garota envergonhada pelos seus atos:
— Jovem, vejo que suas roupas dizem alguma coisa, mas sua boca não quer falar. Há algo que queira me contar?
— Acabo de voltar do bordel, senhor.
— Isso é deveras inaceitável! Uma garota como você não deve frequentar esses locais!
— Me desculpe senhor, eu só queria conversar com uma amiga minha que lá trabalha.
O vigário ficou sem reações. Como alguém pode visitar uma casa de prostituição e não sofrer as tentações de lá? Quanto uma pessoa deve ser tão ingênua para isso? Conversar com uma amiga, mas que amiga é essa, e quais são as qualidades dessa mulher?
— Minha jovem, seu coração é muito puro e ao mesmo tempo muito vazio. Você já está salva, ou melhor, nunca se perdeu. Mas mesmo sã você não pode se misturar com alguém que possa te afogar nos pecados dessa vida.
— Obrigado senhor, e prestarei mais atenção no meu caminho.
Ia indo embora, quando se lembrou da amiga. Nunca mais iria vê-la, nem deixar claro a razão. Segundo o arcebispo, seu caminho estreme pode ser modificado facilmente, e essa mulher poderia desviá-la sem muito esforço para a perdição.
Dormirá com uma última pergunta sem reposta: a meretriz está errada ou o senhor da igreja generalizou todos os injustos?
Nenhum comentário:
Postar um comentário