"E tu, bondosa alma, que te sentes tão angustiada como ela...
Consola-te com os seus sofrimentos, e permite que esta pequena personagem se torne sua amiga
(com todo vosso zelo e compaixão) que, por destino ou culpa própria, não tiveres outro mais próximo.
Não poderei recusar vossa admiração e amor para essa alma, nem ao seu caráter.
E com lágrimas, acompanhe o seu destino."

Sofrimentos do Jovem Werther (Primeiro Livro) - Goethe

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

47_ Atalho das transgressões


   À primeira vista, o táxi era tão confortável como parecia ser do lado de fora, principalmente se os filtros de cigarros e as latas de cerveja rolando pelo assoalho fossem levados em conta. Por educação, a garota  tentava ignorar o odor nauseante, mas esse era mais forte e roubava-lhe toda a atenção, e o que lhe restava era suficiente para lembrar a dor de cabeça. Sem que isso tudo fosse suficiente, ainda era bombardeada por futilidades do taxista.
 — Você não está bêbada, está?
 — Não.
 — Sim, sim... Só evite sujar o estofado. Custa caro mandar lavar isso.
 — Senhor, eu não estou bêbada, apenas...
 — Usou drogas?
 — ... Estou com dor de cabeça.
 — Oras, pra isso eu tenho cura.

   E com uma mão no volante, começou a vasculhar o porta-luvas em busca de algo.
 — Achei! Aqui está, pequena.
 — Agradeço, mas eu não preciso não senhor. Isso já vai passar.
 — Que isso. Eu insisto, e tem muito aqui. Sei que você vai ficar bem melhor, só não tenho água aqui.

   Cedendo a insistência do rapaz, fez um gesto de tomá-lo, mas o escondeu entre os dedos da mão e guardou o remédio na bolsa.
 — Senhor? Pode me deixar ali na frente.
 — Mais algumas ruas e chegamos, não tenha pressa.
 — Não se preocupe, posso ir andando agora.
 — Faço questão de te deixar no endereço. Agora pode deitar e descansar a cabeça.

  “Como o taxista insiste tanto em me levar até o local?”
— Olhe; a próxima rua é contra-mão e o senhor vai precisar contornar o bairro. É melhor eu seguir a pé daqui pra frente. Quanto custou?
— Trinta reais, mais cinco pelo remédio.

   Alguns minutos depois, dois vis conversariam sobre o dia cansativo, a noite refece, os passageiros que haviam sido transportados pela cidade, algumas fofocas e, óbvio:
 — Cara, você nem acredita: levei uma perdida com macacoa até um canto lá e a droguei.
 — E ai? O que houve? Rolou?
 — Nem. Não teve nada de mais, ela saiu antes do comprimido fazer efeito. Com certeza vai ter uma noite ótima!

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